domingo, 18 de janeiro de 2009

Elementar, meu caro!

Entre as publicações das duas primeiras edições do Livro dos Espíritos, Kardec desenvolveu o interessante conceito de espírito elementar (esprit élémentaire) que foi definido assim:

Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas
Vocabulário Espírita
Espírito elementar, Espírito considerado em si mesmo e feita abstração de seu perispírito ou invólucro semimaterial.

Ainda na mesma obra, num quadro sinótico, Kardec apresenta a natureza íntima dos Espíritos como formada por duas partes: o espírito elementar e o perispírito.

Normalmente, Kardec utilizava palavras novas para designar idéias novas. Foi assim que criou, por exemplo, as palavras espírita e Espiritismo. Entretanto, neste caso, Kardec utilizou palavras que já tinham um significado anterior que é aquele dos espíritos dos quatro elementos da Natureza (hoje, estes são chamados por nós como elementais).

Talvez, esta definição não tenha agradado ao próprio kardec uma vez que ele a abandona. E, possivelmente, o motivo tenha sido a confusão das idéias já que ele se preocupava muito com a clareza na exposição dos textos em suas obras. Ainda assim, encontramos mais uma vez este conceito em uma das respostas do Espírito São Luís (presidente espiritual da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas).

Revista Espírita, março de 1860
O gênio das flores
...
Quem de vós não nos deu doces emoções? Quem não estremeceu ao contato de um perfume amado? Estais admirado, penso, em nos ouvir dizer que há Espíritos para tudo isso, e todavia é muito verdadeiro. Jamais estivemos encarnados, e não estaremos, talvez, jamais entre vós; entretanto, há os que já foram homens, mas poucos entre os Espíritos dos elementos.
...
2. Este Espírito é chamado Hettano; como ocorre que ele tenha um nome e que jamais encarnou?
"É uma ficção. O Espírito não preside, de um modo particular, à formação das flores; o Espírito elementar, antes de passar para a série animal, dirige a ação fluídica na criação do vegetal; este não está ainda encarnado; mas não age senão sob a direção de inteligências mais elevadas, tendo já vivido bastante para adquirir a ciência necessária à sua missão. Foi um destes que se comunicou; ele vos fez uma mistura poética da ação das duas classes de Espíritos que agem na criação vegetal."

Nesta comunicação observa-se que a idéia original, dos elementais, volta à tona e é interessante que Kardec aceita passivamente esta idéia demonstrando o abandono de sua definição no vocabulário espírita. Por tabela, aceita também, de forma natural, a existência de espíritos de animais e plantas.

Mas, este abandono da definição do Espírito elementar não é completo. Kardec reelabora sutilmente o Livro dos Espíritos diferenciando a palavra Espírito com 'E' maiúsculo e a palavra espírito com 'e' minúsculo.

Esta diferenciação é explicitamente colocada por Kardec em uma nota após o diálogo 76 atribuindo o espírito com 'e' minúsculo ao "elemento inteligente universal". Assim, o espírito estaria representando de forma mais clara a definição anterior expressa no seu vocabulário espírita.

Um comentário:

Leopoldo Daré disse...

Caro amigo Vital, acho que neste ponto nossas interpretações estão divergentes.
Realmente o desenvolvimento da idéia de "substância" formadora dos Espíritos, só é claramente definida na segunda edição. Os Espíritos elementares não são tratados na segunda edição com clareza (veja ação dos Espiritos nos fenômenos da Natureza). Para mim, isto indica que Kardec não foi passivo nas informações, pelo contrário, ele não conseguiu ter certeza.
Outro ponto, é que São Luiz não sugere que os Espíritos elementares estejam reencarnados nas plantas, mas que agem sobre as plantas, o que é diferente. Aqui está a discussão sobre a Ação dos Espíritos na Natureza.
Sobre o Espírito em si, descrito nos vocábulos das Instruções Práticas, não é o mesmo que "espírito" da segunda edição, pois o "Espírito em si" é a parte constituída de "espírito" individualizada.
Acho importante anotar que a idéia dos Espiritos Elementares não é novidade espírita brasileira. E este ponto, ainda me parece impreciso na proposta kardequiana.O que reforça a demonstração da preocupação de Kardec em não fechar questão em tudo e se dizer dono da verdade, ele também abre discussões em suas obras.

abraços