quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Em verdade da Verdade

A questão sobre a identidade do Espírito Verdade, que acompanhou Kardec no seu árduo trabalho de elaboração da filosofia espírita, é muito controversa (*) e dificilmente os espíritas chegarão a um consenso. De toda forma, sem a pretensão e mesmo sem o desejo de dar a palavra final, faremos algumas observações a respeito.

Na primeira edição do Livro dos Espíritos Kardec não menciona, pelo menos diretamente, o Espírito Verdade. Os únicos espíritos superiores mencionados são os que estão na nota XVII.


Primeira edição
Nota XVII
... Vários espíritos concorreram simultaneamente a estas instruções, às quais assistiam, tomando alternadamente a palavra e falando um em nome de todos. Entre os que animaram personagens conhecidas citaremos João Evangelista, Sócrates, Fénelon, São Vicente de Paulo, Hannemann, Franklin, Swedenborg, Napoleão Primeiro; os demais habitam esferas elevadas e, ou nunca viveram na Terra ou aqui apareceram em época imemorável.

A primeira menção ao Espírito Verdade parece estar na obra Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas publicada logo após a primeira edição do Livro. Vejam:


Instruções Práticas
Capítulo II - Manifestações Espontâneas
... No princípio de meus estudos sobre o Espiritismo, estando ocupado, certa noite, com um trabalho relacionado a esta matéria, fizeram-se ouvir pancadas em redor de mim no decorrer de quatro horas consecutivas. ... Logo no dia seguinte, interroguei o Espírito ... a respeito das pancadas.
__ Era, foi-me respondido, teu espírito familiar que queria falar-te.
__ E que desejava ele dizer-me?
__ Tu mesmo podes perguntar-lhe, pois ele se encontra aqui.
Tendo eu interrogado esse Espírito, ele se deu a conhecer sob um nome alegórico (eu soube depois, por outros Espíritos, que fora o de um ilustre filósofo da antiguidade).

Este diálogo teria ocorrido em março de 1856 e também pode ser encontrado em Obras Póstumas com a diferença que o nome alegórico é explicitamente indicado como "a Verdade". Ainda nesta obra encontramos um outro diálogo entre Kardec e o Espírito Zéfiro (espírito familiar dos Baudin). Neste diálogo, ocorrido em dezembro de 1855, Kardec toma conhecimento do seu espírito protetor ou bom gênio.


Obras Póstumas
Meu Espírito Protetor
(...)
__ Quem foi ele na Terra?
__ Um homem justo de muita sabedoria.
(...)
__ Quando, faz algum tempo, evocamos S. e lhe perguntamos se poderia ser o gênio protetor de um de nós, ele respondeu: "Mostre-se um de vós digno disso, e estarei com esse; Z. vo-lo dirá." Julgas que eu poderei merecer esse favor?
__ Se o quiseres.

Uma das possíveis hipóteses (novamente sem a pretensão de reconhecer-lhe verdadeira) é a de que o S. seria de Sócrates, o "ilustre filósofo" mencionado por Kardec em Instruções Práticas.

Em julho de 1858 temos na Revista Espírita uma outra menção ao Espírito Verdade. É curioso que, neste diálogo, Kardec se coloca um tanto indiferente a ele. Vejam:


Revista Espírita, julho de 1858
O tambor de Bérésina
18. É de tua própria vontade que vens bater, ou outro Espírito te forçou fazê-lo?
"Foi pela minha vontade que vim; há um que chamais Verdade que pode forçar-me a isso também; mas, há muito tempo, eu queria vir."
19. Com qual objetivo desejavas vir?
"Para conversar convosco; era o que eu queria; mas havia alguma coisa que me impedia. Fui forçado por um Espírito familiar da casa, que me convidou, a me tornar útil às pessoas que me pedissem responder."
Esse Espírito tem, pois, muito poder, uma vez que comanda assim os outros Espíritos?
"Mais do que credes e não usa isso senão para o bem."
Nota. - O Espírito familiar da casa se fez conhecer sob o nome alegórico da Verdade, circunstância ignorada pelo médium.

Já na segunda edição do Livro dos Espíritos Kardec coloca o nome do Espírito Verdade na lista dos espíritos superiores que teriam contribuído para a sua elaboração. Vejam:


Segunda edição
Prolegômenos
São João Evangelista, Santo Agostinho, São Vicente de Paulo, São Luís, O Espírito da Verdade, Sócrates, Platão, Fénelon, Franklin, Swedenborg, etc., etc.

É interessante comparar esta lista com a da primeira edição... foram retirados: Hannemann e Napoleão Primeiro e foram incluídos: Santo Agostinho, São Luís, o Espírito da Verdade e Platão. Também vale destacar, na segunda edição, a colocação dos quatro "santos" no início da lista e o Espírito da Verdade ao lado de Sócrates. Desta forma, aparentemente descarta-se a hipótese levantada acima de que Sócrates seria o Espírito Verdade, ou, pelo menos, Kardec não queria, a esta altura, que o Espírito Verdade fosse identificado com ele.

De qualquer forma, não resta dúvida de que Kardec atribuía ao Espírito Verdade o papel de coordenador do Espiritismo e de que ele também não tinha o menor interesse em revelar a identidade do Espírito Verdade. Aliás, o próprio teria assim recomendado.

(*) Alguns links para um estudo sobre a identidade do Espírito Verdade:
O Espírito de Verdade, quem seria ele?, por Paulo da Silva Neto Sobrinho
Jesus e o Espírito de Verdade, por Fernando A. Moreira

4 comentários:

Paulo Neto disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Paulo Neto disse...

Vital,

No meu site é que se encontrará a versão altual do texto:
http://www.paulosnetos.net/index.php/viewdownload/5-artigos-e-estudos/26-espirito-de-verdade-quem-seria-ele
Se me permite, também sugiro a leitura deste outro:
http://www.paulosnetos.net/index.php/viewdownload/5-artigos-e-estudos/35-jesus-e-o-espirito-de-verdade
abraçços

Vital Cruvinel disse...

Que bacana sua visita, Paulo!

Obrigado pela indicação do novo link. Já atualizei no post.

Obrigado!

Anônimo disse...

Tantas trocas...Evaristo.